Todas estamos convocadas para a Greve Feminista Internacional

8 de Março 2020

MANIFESTO!
Juntas somos mais fortes!

A cada 8 de Março celebramos a união entre as mulheres e mobilizamo-nos em
defesa dos nossos direitos.

Somos herdeiras das lutas feministas e das resistências operárias, anticoloniais e
antirracistas. Reclamamos o património das lutas pelo direito ao voto, ao trabalho
com salário, a uma sexualidade livre e responsável, à maternidade como escolha, à
habitação, à educação e saúde públicas.

Por todo o planeta, somos as mais traficadas e as mais sacrificadas pela pobreza.
Somos do país onde existem 6576 mulheres e raparigas vítimas de mutilação
genital. Somos as sobreviventes da violência de género, que em Portugal mata, em
média, duas de nós a cada mês, 80% das vítimas de violência doméstica e 90.7% das
de crimes sexuais. Somos as vítimas da justiça machista, quando esta fundamenta
as suas decisões em preconceitos, e da cultura da violação, que desacredita a nossa
palavra e desvaloriza a nossa experiência, procurando atribuir-nos a
responsabilidade das violências que sofremos. Somos as que vivem em alerta
permanente, porque o assédio no espaço público e no local de trabalho continua a
estar presente.

Somos múltiplas e diversas, de todas as cores e lugares, de todas as formas e feitios,
com diferentes orientações sexuais e identidades de género, profissões e ocupações.
Somos trabalhadoras, estudantes, reformadas, desempregadas e precárias, do
litoral e do interior, do continente e das ilhas. Somos as invisíveis, as negras e as
ciganas. Somos tu e eu, somos nós, somos tantas e tão diversas.
A 8 de Março, mulheres em todo o mundo levantam-se em defesa dos seus direitos
e mobilizam-se contra a violência, a desigualdade e os preconceitos. Porque as
violências que sofremos são múltiplas, a Greve que convocamos também o é.
No dia 8 de Março faremos greve ao trabalho assalariado, ao trabalho doméstico e à
prestação de cuidados, ao consumo de bens e serviços.

Basta de desigualdade no trabalho assalariado!

É a nós que nos é exigida a conciliação entre a atividade profissional e a vida
familiar, razão que explica que sejamos as que mais trabalhamos a tempo parcial, o
que originará reformas e pensões mais baixas no futuro, reproduzindo o ciclo de
pobreza. Somos mais de metade das pessoas que ganham o salário mínimo, o que
compromete a nossa autonomia financeira. As profissões em que somos a maioria
da força de trabalho são muitas vezes social e salarialmente desvalorizadas. Nelas,
as mulheres negras e imigrantes são as trabalhadoras mais exploradas e
precarizadas. A diferença salarial é, em média, de 15.8%, ou seja, para trabalho igual
ou equivalente, os nossos salários são inferiores, o que faz com que trabalhemos 58
dias por ano sem receber.
Os cargos mais bem pagos são ocupados por homens, embora sejam as mulheres as
que mais concluem o ensino superior (60.9%). A desigualdade salarial com base no
género está presente em todo o lado, nas empresas e instituições privadas e
públicas.
Exigimos salário igual para trabalho igual ou equivalente e a reposição da
contratação coletiva como forma de proteger o trabalho e combater as
desigualdades. Temos direito a um projeto de vida digno e autónomo: não somos
nós quem tem de se adaptar ao mercado de trabalho, é ele que tem de se adaptar a
nós. A gravidez ou os cuidados com descendentes e ascendentes não podem ser o
argumento escondido para o despedimento ou a discriminação.

Basta de desigualdade no trabalho doméstico e dos cuidados!

Para além do trabalho assalariado, muitas mulheres, sem que a maior parte das
vezes isso resulte de uma escolha, têm de desempenhar diversas tarefas domésticas
e de prestação de cuidados e assistência à família. Este trabalho gratuito,
desvalorizado e invisibilizado ocupa-nos, em média, 1 hora e 45 minutos por dia, o
que corresponde, durante um ano, a 3 meses de trabalho. Apesar de não haver uma
recolha de dados étnico-raciais, os dados a que temos acesso mostram que sectores
como as limpezas e o trabalho doméstico são quase um destino obrigatório para as
mulheres negras, ciganas e imigrantes. Levantamo-nos na luta contra o racismo!
Sabendo que as mulheres negras e imigrantes permanecem a força de trabalho mais
barata, altamente explorada e violentada, ocupando as profissões mais precárias e
trabalhos pouco ou não-qualificados.

Reclamamos o reconhecimento do valor social do trabalho doméstico e dos
cuidados e a partilha da responsabilidade na sua prestação. Propomos que este tipo
de trabalho seja considerado no cálculo das reformas e pensões e defendemos o
reconhecimento do estatuto de cuidador/a. Defendemos a redução do horário de
trabalho e igualdade nos tempos de descanso e de lazer. Queremos respostas
públicas de socialização de tarefas domésticas e de cuidados, das creches às
residências assistidas e de cuidados continuados, das cantinas às lavandarias.
Basta de reprodução das desigualdades e do preconceito nas escolas!
Os currículos pelos quais estudamos continuam a contar a história dos vencedores,
reproduzindo vieses de género, classe e raça. A praxe académica, onde o poder é
exercido por meio da humilhação, reproduz violência machista, lesbitransfóbica e
racista, estereótipos e preconceitos de género e objetificação dos nossos corpos.
Defendemos o direito a conhecer a nossa história e a das resistências ao machismo e
ao colonialismo, as alternativas económicas, culturais e ambientais. Exigimos o
direito a uma educação pública e gratuita em todos os seus níveis. Reivindicamos
uma escola da diversidade, crítica, sem lugar para preconceitos e invisibilizações,
uma escola livre de agressões machistas e lesbitransfóbicas, dentro e fora das salas
de aula, uma escola empenhada na educação sexual inclusiva como resposta ao
conservadorismo.

Basta de estereótipos e de incentivos ao consumo!

Identificamos nos media, nas redes sociais, na publicidade e na moda a difusão da
cultura machista. Rejeitamos a sociedade de consumo, que nos condiciona a
liberdade e nos transforma em consumidoras. Não somos mercadoria e, por isso,
recusamos a exploração dos nossos corpos e das nossas identidades, os estereótipos
que ditam medidas-padrão, ideais de beleza formatados, gostos, comportamentos e
promovem estigmas e discriminações. Porque exigimos ser protagonistas das
nossas vidas e donas dos nossos corpos, recusamos o negócio em torno da nossa
sexualidade e saúde reprodutiva e reclamamos a gratuitidade dos produtos de
higiene.

Basta de destruição ambiental!

Recusamos as políticas neoliberais, porque elas são predatórias, destroem a
biodiversidade, provocam alterações climáticas e originam milhões de migrantes
ambientais, o que dificulta de forma muito particular a vida e a sobrevivência de
mulheres, que, em muitas zonas do planeta, são quem se dedica à agricultura e tem
a responsabilidade de prover a família de alimentos. Estamos solidárias com as
mulheres indígenas que resistem à globalização e estão comprometidas com as lutas
contra as alterações climáticas, contra a dependência de energias fósseis e em
defesa da soberania alimentar.
Basta de guerra e de perseguição às pessoas migrantes!
Rejeitamos as guerras e a produção de armamento. Para saquear matérias-primas e
garantir controlo geopolítico e económico, destroem-se culturas, dizimam-se povos
e expulsam-se populações dos seus territórios. As guerras originam milhões de
pessoas refugiadas, entre as quais muitas mulheres e crianças, vítimas de redes de
tráfico humano e sexual, da pobreza e da destruição. Levantamo-nos pelo fim das
guerras, pelo acolhimento das pessoas migrantes e em defesa da alteração da lei da
nacionalidade. No mundo ninguém é ilegal! Quem nasce em Portugal é português/
portuguesa!

Todas estamos convocadas para a Greve Feminista. Todas temos mil e uma razões
para protestar, parar, reivindicar. Fazemos Greve porque não nos resignamos
perante a desigualdade, a violência machista e o conservadorismo. Fazemos Greve
para mostrarmos que as mulheres são a base de sustentação das sociedades.

VIVAS, LIVRES E UNIDAS!

SE AS MULHERES PARAM, O MUNDO PÁRA!

greve-organizadoras